POESIAS


Análises

 

"Cinzenta névoa de um amanhecer estranhamente
melancólico. Vidas passando, correndo, voando. No
sufoco, na ambição, no orgulho de fazer tudo em vão.
A incerteza de agora instala-se condicionada num
canto da memória; sugestão latente no inconsciente
do agir. Continuaremos a fugir.
Desdobraremo-nos em geometria filosófica, metanóica,
ígnea; contígua ao eu do universo paralelo. Credos,
profecias, maldições.
Inserir-se na história tal como queira ser reconhecido.
Desnudo. Hollywoodianizado.
Palcos da ilusão. Distorcidos fazendo jus às vertentes
do momento.

 
Os dedos penetram na lama ardida; mãos calejadas
do eterno aprendiz que somos, que são, quem foram,
Perdidos, esquecidos num caminho sombrio, comprometedor
ao curso da vida. Delegamos insanidades e mentiras.
Sons guturais arrancados do estômago vazio, do luto fraterno,
do desmoronamento pessoal.                                   
Arquétipos, protótipos baratos. Compra-se um em qualquer
esquina. Todos têm um preço. Cada qual com sua sina."           
 
 

 Escolhas

 

 "Eu posso escolher quem quero ser, o que vou
   comer, beber, vestir e quem vou namorar.
   Eu posso ser de verdade ou de mentira. Ou
   de verdadeira mentira. Depende como eu escolherei
   me revelar.
   Eu posso sair para onde eu quiser.
   Posso passear, chorar, gritar sem ser vista e                 
   ouvida. Posso matar a mim mesma pouco a
   pouco, e ninguém ao meu redor vai perceber as
  chagas vazando, pingando o sangue febril que em
  minhas veias borbulha.
  Posso ser amada ou odiada.Ter ou não uma vida ingrata.
  Atuar livremente para seduzir os espectadores a notarem-me, ou
  ignorarem-me. Repudiá-los.
 
  Eu sou o que sou por uma soma de fatores;
  perdida no montante que às vezes deixo render.
  Por escolha própria, ou por falta dela."

 
 
  Arte



“Elementos vitais. Coordenação e técnicas meticulosas, estudadas.
 Rabiscadas. Estilos e formas. Novas, reformuladas. Adequando-se
a busca de sua própria identidade.
Delinear traços, rasos, obtusos,
primitivos, elaborados... apresentá-los. Num quadro, no papel,
no pano... plano feérico, no palpável dimensionado. Concluído.
Esboçado. E na delícia sofrida de realizar tal trabalho, paisagens
e retratos são algo a mais num fundo qualquer, modesto, bem
acabado. Requinte ou esculacho. O ponta-pé às tendências
vanguardistas, ou ser adepta assumida. Ter mil facetas.
Inúmeras escolhas. Possibilidades várias.
Na ousada manobra de reelaborar. Criar.
Produção de cenas numa extensa
listagem de temas fascinantes, medíocres, cotidianos.
Criatividade... deu branco.
Deu zebra. Deu sorte. Fina textura duma mistura nem sempre
harmônica, nem tão delicada, nem tão poética.

Os sentidos se apuram na perpétua procura da fórmula ideal.
Pinceladas na medida certa. Ou não. Efeitos
surpreendentes, comedidos. Improvisação inspirativa.
Ângulos e jogos de luzes sob vários prismas.
Viver os sabores e dissabores de ser artista, de ser louco e
sonhador, ser solitário e agitado. Perspectiva conturbada.
Revelação crua.

Um impulso acelerado, compassado, vago... tudo depende
da emoção. E do fluxo de entrega, à raiva ou às pressas,
numa façanha ricamente descoberta, por muito cética da
capacidade própria dos que querem gritar. Mas o fazem
de modo fértil e arrebatador visualmente. Como também
o fazem embalando nossas pálpebras ao lirismo tenro,
seja qual for o gênero, seja qual for a proposta. Zelai por essa
irmandade pueril de alma e de impressões, que transborda
toda sua essência de um modo que saiba
mais ou menos fazer, porém o faz para se multiplicar,
tentando imortalizar sua passagem ora pouco
notada, ora festiva; admiravelmente ordinária. Uma sinopse
de sua jornada.”




Dias
 



“O meu eu dormiu em algum lugar vagabundo,
onde a paisagem abstrata é insólita, e o disseca.
Desprezível agonia. Homeopaticamente meus dedos
ganham o céu torrencialmente inundado pela chuva
cálida de janeiro.
As figuras pairam distorcidas no ambiente, envolvendo-me
num ar sereno, de verdadeira harmonia com tudo que
me cerca.
Os ruídos cegam-me da alienação. Nunca submissa.
Insurreição. Em toda guerra há sua tomada de fôlego.
Não sou de guerra, sou de paz. Paz bélica mapeando terreno.
 
Os objetos multiplicam-se por demais.
Na cólera desvairada de dias febris, a angústia deprimente
enfatiza o desespero do não saber. Irrelevante questionar.
Frases soltas, colocações introspectivas, ora abusivas, que
procuram solo fértil para florear.”
 


Simplesmente mulher

 
" Seus sapatos seguindo rastros, suportando fardos que só

mulheres como nós sabem aguentar. Sobreviver de migalhas,

farelos pisoteados só para fazer jus aos sonhos de uma

esperança quase sem fim.

 

São pés cansados beirando o asfalto da discórdia e da dor.

Num mundo doente, nossas mãos buscam sementes tragadas

pelo chão quase sem vida, seco de amor.

 

O corpo padece, vacila, mas a mente elucida que há tanto por fazer,

seria egoísmo continuar a questionar. Esse é o preço, e mesmo

à beira do desespero, a verdade  não nos pode faltar. Através

dela vem a coragem, e amor, e vontade de seguir forte adiante,

mesmo que ninguém perceba. E ninguém percebe.

Quem sabe das suas cicatrizes, das batalhas das quais saiu

derrotada, quase morta?

Quem sabe dos seus sonhos e meninices, dos seus fantasmas e sandices?

 Seus anjos e suas trevas estão consigo, e somente consigo,

 nenhuma paixão efêmera poderia compreender.

 

 Então brava guerreira, deusa da justiça e da liberdade, grande

 mãe que traz vida e orienta o mundo; continue sendo, mesmo

 que em muito se anulando, esta grande alma que num corpo

 mortal segue rumo à luz da Verdade Suprema..."

 

 

 


 
 
 
 

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